segunda-feira, novembro 22, 2004

Carta Para Um Amor Ausente - V

V

Há sempre um dia em que tudo acaba e hoje parece que é o nosso.

Sofro e, talvez pela primeira vez não é por tua causa. Dentro de mim as lágrimas correm como um rio de água cristalina, mas a verdade é que a dor me tornou progressivamente imune às manifestações espontâneas de sentimentos. Não choro, e na verdade choro todos os dias.

Sinto-me triste comigo mesmo o que é bastante doloroso. Sinto que os olhos humedecem, mas sinto-me incapaz de chorar. Como se o mundo como eu o conheço acabasse se eu chorasse.

Percebo agora que não és assim tão importante. Talvez tenhas sido o meu amor, o meu grande amor, mas agora o meu mundo mudou e já não gira à tua volta. Está na altura de olhar em volta e estabelecer prioridades. (lembras-te de me dizer que o meu problema era estabelecer prioridades?) Amanhã surgirá um desafio maior que o de hoje, quanto mais não seja o desafio está em viver o dia de amanhã sem cair no tédio da repetição do que ontem foi e não volta a ser. Viver cada dia como uma dádiva e senti-lo como único, não numa perspectiva saudosista, mas como uma criança que acaba de descobrir um brinquedo, uma palavra, o efeito de um sorriso.

Ainda hoje, por muitos erros que tenha cometido, por muitas lições que tenha aprendido, continuo a cair nos mesmos erros, muitas vezes por achar que as pessoas podem mudar e acabo por lhes dar mais uma oportunidade, outras vezes porque me deixo levar por aquilo que a minha intuição me diz, e por vezes ela também se engana.

Todos nós desejaríamos voltar atrás numa ou noutra situação na nossa vida. Isso revela que por um lado essa situação foi extremamente intensa e marcante, mas por outro lado revela que ainda não a ultrapassámos.

Talvez tenha querido voltar a trás e corrigir os erros que cometi contigo, mas agora não. Aprendi a viver assim, ultrapassei-nos. Se sou mais feliz??? Não faço a menor ideia, mas espero descobrir em breve. A verdade é que não quero voltar atrás, quero sim seguir em frente, ansioso pelo novo dia, por novos desafios, por novos erros e novas lições. Há coisas que só acontecem uma vez na vida. Não há dois pôr-do-sol iguais, não há duas gotas de chuva iguais. Certamente que não haverá outro amor igual, mas ainda bem, nada seria pior do que estar a amar por comparação.

Os nosso caminhos cada vez mais se afastam e, apesar de parecer sempre que as nossas despedidas são apenas “Até já!”, essa frase está cada vez mais gasta e perde-se ecoando por entre o abismo que surge entre nós.

Sim, vejo-te claramente do outro lado, mas não te ouço, de tal forma que acredito que mais não és do que uma miragem e sigo em frente.

Não direi adeus nem qualquer tipo de despedida melodramática que encerra uma carta.

Digo apenas que os sonhos não são mais que uma outra forma de ver a mesma realidade de sempre.