segunda-feira, novembro 29, 2004

Eu Já Vi Este Céu - Capítulo II

Capítulo II

Nem sempre William fora um vagabundo. Houve tempos em que era um jovem feliz e rebelde que achava que tinha o mundo nas mãos e não precisava de nada nem de ninguém para ser feliz. Nessa altura surgiu uma mulher, surge sempre uma mulher que altera o ruma da nossa vida. Chamava-se Mariana e tinha mais ou menos a idade dele. Nessa altura, segundo me contou, os tempos eram outros, as raparigas diferentes e os sentimentos também. Fiquei com a impressão que me estava a censurar e à minha geração, ou apenas a constatar um facto que julgava eu já ter apreendido.

Era e sempre será um homem misterioso que ora era directo e pragmático, ora falava em enigmas, charadas e provérbios. Por vezes não me apercebia qual o alcance das suas palavras, mas rapidamente aprendi a percebê-lo e a compreender as suas palavras e actos.

Mas estava eu a falar da Mariana. A Mariana foi a primeira paixão de William, que até então, do alto dos seus 14 anos achava que as mulheres se tornavam pouco interessantes ao fim de uma semana, pelo que nutrir qualquer sentimento de apego e necessidade por uma mulher era um perfeito disparate.

Um dia um amigo chegou ao pé dele e perguntou-lhe se ele queria conhecer uma pessoa. William olhou-a de alto a baixo, olhou para os amigos em busca de uma opinião e ao verificar que eles se babavam literalmente ao olhá-la, achou que até era capaz de conseguir aguentar uma semana. No entanto exigiu que ela fizesse metade do caminho para o conhecer. E assim aconteceu. Dois dias depois passeavam pela escola de mão dada e encontravam-se todos os intervalos para darem um beijo e passearem pela escola para que todos vissem que eram namorados, ainda por cima ela era mais velha do que ele. Naquele tempo era assim que se namorava, contávamos quantos beijos dávamos, não é como os miúdos de agora que tentam comer o maior número de gajas por semana e ainda tentam levá-las prá cama para poderem classificá-las com os amigos, era o que ele me dizia sempre que me contava esta história. E eu não me importava de o ouvir contá-la vezes sem conta pois colocava sempre tanta paixão em cada palavra que dizia que eu me sentia fascinado. Por outro lado, sempre que contava esta história acrescentava mais qualquer coisa, não sei se fruto da sua imaginação, se apenas porque das outras vezes não se tinha recordado, o que acontecia muitas vezes pois estava sempre atento ao que se passava à sua volta e sempre a pensar em tudo ao mesmo tempo. Ganhei um pouco esse vício com ele! Voltando à história. Beijavam-se todos os intervalos enquanto passeavam pela escola num percurso que era feito por todos os casais assumidos ou por grupos de rapazes que faziam o percurso no sentido inverso ao das raparigas para se poderem cruzar com elas e trocar olhares, olás e quem sabe se mais tarde não trocariam mais qualquer coisa. No início do dia procuravam-se mutuamente para se beijarem de bons dias, e no final das aulas encontravam-se no portão de saída para irem juntos parte do caminho. Durante uma semana foi assim que decorreu o seu namoro, sem conversas fúteis para além das devidas apresentações e algumas palavras trocadas em relação a música e pouco mais. Mas a pouco e pouco o tempo foi passando e começaram a partilhar mais qualquer coisa que apenas carícias. Partilhavam paisagens, sonhos e chatices que os perturbavam. A pouco e pouco foram tomando consciência de que o outro representava mais que uma mera curte de adolescentes.

Passaram a partilhar os tempos livres durante a semana e depois passaram a encontrar-se esporadicamente aos fins-de-semana. O tempo foi passando e quando deram conta já tinha passado mais de um mês desde que deram o primeiro beijo. Era sempre nesta altura que o via mais triste, com um ligeiro brilho de lágrima nos olhos, mas respirava fundo e já só parava no final da história. Nessa altura os temas de conversa começaram a tornar-se repetitivos e William começou a desejar mais espaço. Sentia-se sufocado, sem espaço para viver, sem hipótese de errar. O comportamento de Mariana também começou a mudar, fazia exigências e birras absurdas (para ele) que colapsavam por completo qualquer tentativa de recordação dos velhos tempos. Um dia. Pouco tempo antes dos dois meses ela chegou ao pé dele e disse-lhe que já não gostava dele, ou talvez gostasse mas não tinha a certeza. Talvez um dia, disse ela Acreditas nesta merda: talvez um dia… Respondi-lhe que também já não sentia nada por ela e que tinha encontrado outra pessoa mais honesta e verdadeira. Acho que para os meus 14 anos até que tive uma saída airosa. Não voltei a falar com ela desde então, mas encontrei-a uns anos mais tarde na Universidade e ela ainda se recordava de mim. Depois de alguns copos disse-me que na altura me achava demasiado imaturo e que fui a primeira grande paixão dela. Mas isso já não interessa. Acho que se casou alguns anos mais tarde com um professor dela. Devia ser uma daquelas galinhas que eles tanto gostam! Estas eram as palavras que entoava em tom de vingança, de justiça feita pelo tempo. Sentia-se mais confortável com o facto de o destino lhe ter dado um certo prazer com a sorte amorosa dela. Sentia que tinha razão naquilo que tinha pensado dela.

Por esta altura pedia-me sempre que o acompanhasse num passeio pelo parque para que em silêncio engolisse as suas mágoas que nunca assumia, para deixar que o rio levasse para o mar as memórias que o atormentavam.

Era muito fácil ouvi-lo contar histórias. Por vezes pressentia o meu mau humor ou a minha preocupação e então escolhia histórias verdadeiramente hilariantes que julgo terem tanto de verdadeiro como de fantasia, mas deixavam-me quase sempre com um sorriso nos lábios. Aquela que nunca mais me esqueci é a história do João Magalhães.

O João é o gajo mais azarado que eu conheci até hoje, com um leque de atrocidades sofridas que não passa pela cabeça de ninguém. Era tão desastrado com as mulheres como com os carros ou com o estudo.

Conheci-o na Universidade e passámos bons momentos juntos, e onde quer que estivéssemos o Joca conseguia meter o pé na argola.

Houve uma vez em que ele veio ter comigo bastante indignado porque o professo de Análise Matemática I não lhe tinha lançado a nota na pauta. “Esta merda não pode ser. Vou falar com o gajo e fodo-lhe o juízo. Fiz aquele exame para ter pelo menos dezasseis e o gajo não me lança a nota. Ele vai ver!” E lá vai o Joca de peito feito ao gabinete do prof. pedir-lhe explicações. Eu vou com ele para ver se ele não fazia asneira. Assim que chegamos bate arrogantemente à porta e entra sem receber licença para tal. Assim que começa a falar exaltado com o professor reparo na cara de admirado do professor e apercebo-me de uma enorme pilha de exames que estava em cima da secretária. Assim que ele acaba o seu discurso com um modesto: “Ou o senhor me lança a nota ou eu saio daqui e vou já directo à reitoria apresentar queixa de si!”, o professor pergunta-lhe novamente o nome e o curso, dirige-se à pilha de exames e diz-lhe:” Até lhe posso dizer já a nota. O senhor teve zero, ou melhor, não teve nada, desistiu do exame.” “Não pode ser, eu fiz o exame todo! O senhor está a gozar com a minha cara!” Quando o professor o Joca vê realmente uma folha de exame com a sua letra e com um declaro que desisto bem legível. Quando olha para o cabeçalho vê que estava no gabinete do prof. de ALGA a olhar para o exame de ALGA a que tinha ido dois dias antes e tinha desistido. Para não dar o braço a torcer o João vira-se muito indignado:”Mas o senhor não é o professor de Análise I. A ALGA já eu sabia que tinha desistido. Muito obrigado!” e sai disparado do gabinete do professor. Eu tive de me conter para não me desmanchar a rir no gabinete. Calmamente lá foi o João ao gabinete do prof. certo e ficou a saber que não tinha saído na pauta pois tinha-se esquecido de preencher o cabeçalho da folha de exame.

Eu delirava sempre com esta história e tentava imaginar a situação e a cara do professor de ALGA ao ouvir tão rebuscado discurso.

Ainda hoje as histórias engraçadas me fazem sorrir. Disse-me um dia que tudo aquilo que nos fica guardado na memória não deve apenas ser considerado informação inútil que um dia adquirimos em sabermos muito bem como nem porquê. Tudo o que, por algum motivo que desconhecemos, nos fica registado na memória e que podemos recordar a qualquer instante deve ser utilizado pois só por essa razão é que nos ficou registado. Dizia-me que não haveria de estar eternamente naquela cidade e que um dia se iria embora porque ficaria cansado de ver sempre os mesmos pássaros a cantar nas mesmas árvores e a mesma água a correr sempre no mesmo sentido no leito do rio. Mas isso não era razão para que as suas histórias não me fizessem sorrir, ouviste-as tantas vezes que já as sabes de cor, e sempre que te aperceberes que estás chateado ou preocupado com algo absurdo deves recordar a história que te apetecer ouvir e conta-a a ti próprio. Assim podes sorrir mesmo que eu não esteja cá. Algum tempo depois da sua partida uma amiga deu-me um desenho com um boneco a fazer birra e disse-me que sempre que eu estivesse a fazer birra com alguém por qualquer motivo deveria recordar esse desenho e acalmar. O que é facto é que sempre que me punha a resmungar com alguém por causa de coisas absurdas, recordava-me daquele desenho com um figurão “a fazer beicinho” e limitava-me a sorrir. Passei a fazer o mesmo com as histórias do William.

quinta-feira, novembro 25, 2004

Quem é afinal William Jack - Eu Já Vi Este Céu - I

“Eu já vi este céu”

Capítulo I

Gosto de me sentar aqui, como agora para simplesmente não fazer nada. Por vezes são estes momentos de pura apatia que nos levam a alcançar grandes decisões e nos proporcionam grandes descobertas. Em quase todos estes momentos algo de melhor e mais forte e agradável surge, e nem sempre custa muito.

Muitas vezes consigo ficar horas sem fazer, nem pensar em absolutamente nada, ou então sou bombardeado de ideias e pensamentos que não consigo raciocinar.

Mas nada disso interessa quando o vazio nos invade e nos faz sentir como a mais ínfima parte deste universo que por si só já deve ser infinito. É esse vazio que nos impulsiona ou precipita, que nos faz virar costas ao abismo ou saltar de olhos fechados. É esse vazio que nos preenche e ocupa os nossos momentos de solidão, mesmo quando existe alguém que nos faz sentir, por breves instantes, que somos alguém.

O vazio leva-nos ao outro extremo: o mais repleto preenchimento que se pode alguma vez sentir. Há quem lhe chame Amor, outros optam por desprezá-lo, considerando-o um simples capricho que é comum nos seres fracos e inferiores. Li hoje um mail sobre virgindade, não no sentido físico que sempre atribuiremos à palavra, mas num sentido muito mais figurado e que tenderá a ser perene caso a nossa sociedade evolua culturalmente. A nossa virgindade é e será sempre parte de nós, porque a cada momento da nossa vida somos enfrentados por novos desafios que nos proporcionam novas experiências, novas perdas de virgindade: a virgindade no amor, a virgindade na ausência de amor, a virgindade da paixão e a virgindade da perda de paixão. Acho que já dei exemplos suficientes para me fazer entender, ainda que esteja consciente que tudo isto não passa de um texto escrito às 2:44 da manhã e que não tem sentido nem objectivo nem qualquer outra presunção possível que não seja o meu prazer de escrever. Posso estar a parecer egoísta, mas estou certo que qualquer escritor, ao escrever um romance, procura prazer na sua escrita, não obrigatoriamente a escrita destinada às massas.

Posso dizer orgulhosamente que do alto dos meus 22 anos, já tenho experiências de vida capazes de preencher uma larga dezena de páginas, e talvez seja isso mesmo que eu vá fazer nestas páginas: partilhar as minhas experiências de vida e até as que chegaram até mim na forma de “um amigo meu ouviu dizer que”.

Não sei muito bem por onde começar. Para mim sempre foi muito complicado escrever dia após dia sobre o mesmo tema, pelo que não faço a menor ideia de como é que isto se faz.

Penso que as histórias sobre venturas e desventuras amorosas são sempre engraçadas de escrever e de ler. Poderia contar meia dúzia de histórias engraçadas sobre as minhas ex-namoradas ou apenas sobre meros encontros furtivos que ocorriam em noites isolada. Penso que é melhor começar com uma história que me contaram. Dois jovens em plena descoberta dos seus corpos, dos seus espíritos e dos seus sentimentos. Aquilo que sentiram foi algo estranho mas, próprio da idade, não tentaram encontrar uma resposta que lhes desse uma luz sobre o que se passava. Quando deram conta estavam terrivelmente apaixonados e fisicamente separados por alguns quilómetros que ainda demoravam algum tempo a percorrer. Foram mantendo o contacto e teimosamente acharam que continuavam apaixonados e foram lutando contra tudo e contra quase todos, mas lutavam acima de tudo contra eles mesmos, contra a sua natureza selvagem que lhes fazia desejar liberdade, ao mesmo tempo que tentavam acorrentar-se um ao outro.

Alguns anos passaram e eles continuavam em contacto, e o tempo que tinham estado juntos, todo somado, não chegaria para fazer um mês, nem que fosse um Fevereiro muito pequeno. Sem que dessem por isso, passaram a “amar-se” só por teimosia, tinham passado tanto tempo a lutar para ficarem juntos que não fazia sentido desistir de tudo isso agora. Já que lutaram pelo menos que tenham algum proveito.

Entretanto a distância tornara-os bons amigos, mas também os tornou estranhos. Sentiam que não se conheciam, que do outro lado do mundo estava alguém diferente do companheiro de batalha. Foram perdendo batalhas atrás de batalhas, umas vezes por falta de comparência, outras porque pura e simplesmente não lhes apetecia lutar. Acho que não preciso de dizer muito mais. No entanto, segundo diz o meu amigo, eles continuam a ser os mesmos teimosos que eram quando se conheceram, pelo que nunca se sabe o que o futuro lhes reserva. Quem sabe se não estarão dispostos a cometer os mesmos erros apenas em nome dos velhos tempos.

Agora eu deveria reflectir sobre a história que acabo de vos contar, mas sinceramente, quem sou eu para vos dizer o que devem pensar. Tirem as vossas ilações e usem-nas como vos parecer mais correcto.

Mas esta foi uma história muito breve, apenas para vos adormecer um pouco e para eu aquecer um pouco. Acho que agora já me sinto preparado para escrever algo realmente complexo e que vos pode ajudar em muitas situações.

Conheci-o pouco depois de acabar o secundário e dar entrada na mais antiga universidade do país.

Conhecemo-nos como que por acaso e fomos mantendo contacto regular e partilhámos bastantes histórias. Chamava-se William Jack!

segunda-feira, novembro 22, 2004

Carta Para Um Amor Ausente - V

V

Há sempre um dia em que tudo acaba e hoje parece que é o nosso.

Sofro e, talvez pela primeira vez não é por tua causa. Dentro de mim as lágrimas correm como um rio de água cristalina, mas a verdade é que a dor me tornou progressivamente imune às manifestações espontâneas de sentimentos. Não choro, e na verdade choro todos os dias.

Sinto-me triste comigo mesmo o que é bastante doloroso. Sinto que os olhos humedecem, mas sinto-me incapaz de chorar. Como se o mundo como eu o conheço acabasse se eu chorasse.

Percebo agora que não és assim tão importante. Talvez tenhas sido o meu amor, o meu grande amor, mas agora o meu mundo mudou e já não gira à tua volta. Está na altura de olhar em volta e estabelecer prioridades. (lembras-te de me dizer que o meu problema era estabelecer prioridades?) Amanhã surgirá um desafio maior que o de hoje, quanto mais não seja o desafio está em viver o dia de amanhã sem cair no tédio da repetição do que ontem foi e não volta a ser. Viver cada dia como uma dádiva e senti-lo como único, não numa perspectiva saudosista, mas como uma criança que acaba de descobrir um brinquedo, uma palavra, o efeito de um sorriso.

Ainda hoje, por muitos erros que tenha cometido, por muitas lições que tenha aprendido, continuo a cair nos mesmos erros, muitas vezes por achar que as pessoas podem mudar e acabo por lhes dar mais uma oportunidade, outras vezes porque me deixo levar por aquilo que a minha intuição me diz, e por vezes ela também se engana.

Todos nós desejaríamos voltar atrás numa ou noutra situação na nossa vida. Isso revela que por um lado essa situação foi extremamente intensa e marcante, mas por outro lado revela que ainda não a ultrapassámos.

Talvez tenha querido voltar a trás e corrigir os erros que cometi contigo, mas agora não. Aprendi a viver assim, ultrapassei-nos. Se sou mais feliz??? Não faço a menor ideia, mas espero descobrir em breve. A verdade é que não quero voltar atrás, quero sim seguir em frente, ansioso pelo novo dia, por novos desafios, por novos erros e novas lições. Há coisas que só acontecem uma vez na vida. Não há dois pôr-do-sol iguais, não há duas gotas de chuva iguais. Certamente que não haverá outro amor igual, mas ainda bem, nada seria pior do que estar a amar por comparação.

Os nosso caminhos cada vez mais se afastam e, apesar de parecer sempre que as nossas despedidas são apenas “Até já!”, essa frase está cada vez mais gasta e perde-se ecoando por entre o abismo que surge entre nós.

Sim, vejo-te claramente do outro lado, mas não te ouço, de tal forma que acredito que mais não és do que uma miragem e sigo em frente.

Não direi adeus nem qualquer tipo de despedida melodramática que encerra uma carta.

Digo apenas que os sonhos não são mais que uma outra forma de ver a mesma realidade de sempre.

segunda-feira, novembro 15, 2004

Carta Para um Amor Ausente - IV

IV


Por vezes sinto necessidade de chorar e não estás por perto. Nem o teu perfume surge no ar, nem existem objectos perdidos por onde me encontro que me possam recordar a tua presença, a tua pela, o teu calor; a suavidade da tua voz murmurando todo o amor que sentes por mim.

Recordo-me da última vez que chorei nos teus braços, não fazia ideia que seria a última. Nada dizia que tantas coisas que casualmente partilhámos seriam as últimas recordações que agora me enchem as noites. Tanta merda que vivemos juntos e nem por isso pareceu que houve alguma diferença. Parecíamos crianças que fazem birras idiotas por causa de um gelado, e mesmo essas birras têm mais significado que as nossas.

Ouço músicas que me fazem lembrar todos os bons momentos que vivemos juntos, e de repente a raiva começa a crescer em mim. Por um lado desejo-te tudo de bom, mas ao mesmo tempo não consigo de ter um secreto desejo que tudo te corra mal, que sofras tanto quanto eu sofri por tua causa. É um desejo de justiça feita pelo próprio destino, um desejo que me anima e ao mesmo tempo me entristece por ser um desejo vil e vingativo.

Nunca disse que era perfeito. Mais, sou o primeiro a reconhecer os meus defeitos, mas querer vingar-me de ti parece-me demasiado, mesmo para mim que de vez em quando consigo ser mesmo mau.

Talvez desta vez não tenha nada que te agradecer, a não ser de um modo extremamente sarcástico, pelo facto de me teres mostrado como dói amar e perder esse amor. Talvez agora seja capaz de dar valor ao amor se o voltar a encontrar. Pelo menos sei que já dou mais valor às minhas amizades, uma forma de amor mais puro, digo eu.

Mas não, não te vou agradecer. Talvez te leve comigo para os meus sonhos, mas recuso-me a aumentar a raiva que surge entre nós.

quinta-feira, novembro 11, 2004

Carta Para um Amor Ausente - III

III

Hoje tirei o dia (ou seja, a noite) para te escrever.

Por vezes penso em ti. Longe vai o tempo em que algo nesses pensamentos me consumia lentamente. Agora, penso em ti como justificação para os meus pensamentos, para as minhas acções. E até me divirto em ver até que ponto estás assim tão entranhada na minha vida.

Se calhar estás muito menos do que à primeira vista parece, mas és a desculpa perfeita para tudo. Para os meus amores e desamores, para as minhas conquistas (cada vez mais raras) e para os meus fracassos. Devo dizer-te que falar em ti, em nós, tem sido muito útil para que pessoas que poderiam estar interessadas em mim, estando eu já interessado, se afastem, ou permaneçam distantes.

Mais uma vez termino dizendo: Obrigado!

Carta Para um Amor Ausente - II

II

Dias e dias sem te ver. Acho que podia jurar que passaram anos, e mesmo anos depois o meu coração doía só de pensar em encontrar-te, só de achar-me sozinho no meio da noite.

Percorria então centenas de quilómetros para te abraçar, completamente consumido pela saudade, refém de um sentimento que almejei chamar amor, sentimento esse para o qual não tenho nome.

Continuas bonita como sempre, com aquele olhar que desmancha qualquer disfarce, qualquer postura de força, e eu apenas resisti porque fugi. Contava os segundos até que o silêncio entre nós se tornasse constrangedor, aquele momento em que ambos sabemos qual vai ser o tema da conversa, um tema que nenhum de nós quer abordar porque não temos a certeza daquilo que sentimos, de tal modo que nem temos uma palavra para esse sentimento.

Por mais que tente estás demasiado entranhada na minha memória, e só uma enorme pancada e graves danos poderiam provocar-me uma amnésia suficientemente grave para te esquecer.

Sim, é verdade que sigo em frente, vivo a minha vida da melhor forma possível, que não estou no tal estado catatónico que acontece sempre a seguir à desilusão, a seguir à ruptura, mas acho que evoluí para um estado catatónico diferente em que não tenho a percepção do mundo sentimental que me rodeia, tudo são objectos, meros instrumentos que me são oferecidos para manipular consoante a minha vontade. De tal forma este estado é forte que me recuso a viver naquele mundo lá de fora só para não magoar ninguém, pelo menos esta é a desculpa que dou a mim mesmo para tais comportamentos.

E não é que resulta????

Estou a dar-me bem comigo mesmo, suporto-me. Naturalmente que o facto de apenas lidar comigo mesmo apenas num nível profissional também ajuda, mas acho que me conheço agora como nunca, sei (ou vou sabendo) o que quero e onde quero chegar. Coloco-me em primeiro lugar na lista de prioridades, sou o que de mais importante tem a minha vida, e tenho de confessar que sem a tua ajuda não teria conseguido, se não me tivesses magoado tanto, se não me tivesses desiludido continuaria a achar que eras a mais forte razão para viver. Assim, tornei-me independente (a minha única dependência regressou com a tua ausência, os meus cigarros), apenas levemente agarrado ao meu trabalho.

Acho que nunca pensei dizer isto, mas…. Obrigado!

Carta Para um Amor Ausente

<> I

Desculpa se nada tenho para te dizer quando te olho nos olhos e fico simplesmente a admirar a sua beleza. Perdoa-me se aquilo que sinto por ti não cabe nem em todas as palavras que inventaram neste mundo e no outro, qualquer que seja a língua ou dialecto.

Crucifica-me por te achar a mais bela de todas as mulheres que caminham à face da terra e por dizê-lo sem medo a quem quer que seja.

Sim, irei arder nas chamas do inferno se tudo isto são pecados ou ofensas à tua pessoa. Não desejei, em momento algum, mais do que amar-te, fazer-te sentir desejada, fazer-te feliz. E apenas por isso estou como estou, sem as tuas palavras doces, sem o teu olhar meigo, sem mais nada que as recordações que guardo preciosamente do tempo que passamos juntos.

Passo noites sem dormir só para pensar em ti, vasculhando a minha memória em busca de imagens tuas que ainda não tenha recordado. A agonia do tempo vai destruindo, aos poucos, essas imagens, qual fotografia antiga esbatida pela humidade.

Choro! Claro que choro. Choro muitas vezes aparentemente sem razão porque qualquer raio de tristeza inunda a minha face e passo longos momentos a chorar enquanto recordo os momentos que passámos juntos.

Será que ainda te lembras dos sonhos que criamos naquele dia à beira-mar? Calculo que não, nem sequer te lembras das promessas que me fizeste, quanto mais de “coisas insignificantes” como os sonhos.

Sim, agora percebo. Como poderíamos alguma vez ficar juntos se não acreditas em sonhos, se os desprezas e ignoras em prol da tua “sempre tão certa” racionalidade?

Sabes, agora que penso bem, os teus olhos nem são assim tão meigos, nem as tuas palavras tão doces. E tu, tu nem és assim tão bela. (Devo dizer que a rapariga que acaba de passar tem um nariz muito mais bonito que o teu!!!)

Sim, agora percebo. Não fui mais que “mais um”, outro tolo que te idolatrava e servia para os teus caprichos enquanto não te cansaste. Depois, passei a ser apenas mais um que se achava importante.

Pois então fica sabendo, agora sou eu quem te ignora, agora é a minha vez de te desprezar (até porque a rapariga do nariz bonito está a olhar para mim), não esperes mais palavras de mim, não fiques à espera que continue a perder o meu sono só para pensar em ti.

Agora vou dormir dias inteiros só para sonhar (e quem sabe se não vou sonhar com aquele nariz…), vou ter tempo para ver o tempo passar por mim devagar, as minhas memórias vão ganhar cor.

Ah! Agora sim vou voltar a viver…

segunda-feira, novembro 08, 2004

Viagens 2003

Peniche I

Digo que é cidade

Não pela grandeza

Ou pelo título mas por aquilo

Que me parece

Deste local

Com Sol e mar

E noites com vento

Com luzes brilhando

Do outro lado do fosso.

E um forte claustrofóbico

Que amordaçou a liberdade

Anos e anos a fio.

Agora sinto o grito de revolta

Em cada gaivota que voa sobre o mar.

Peniche II

Sopra sempre um breve vento

Por vezes desagradável,

Mas quase sempre refrescante.

As pessoas riem

E eu rio com elas.

À beira-mar contemplo o sol

Mas procuro luas e estrelas

Para me embalarem o sono.

Berlengas

Lagoas azuis

E elefantes talhados em pedra tosca.

A bela Inês surge

Esculpida nas rochas

De um mar calmo

Com águas límpidas

Onde o meu reflexo

Se transfigura

Numa calmaria de Luz.

Parabéns!

Hoje acordaste de manhã

Encheste os pulmões de ar

Como já não fazias há umas horas.

Inalaste milhões de moléculas de oxigénio

Que permitiram que outros tantos milhões de células

Funcionassem normalmente.

E no meio desta rotina

Que se repete há tantos anos

Esqueceste-te que estás viva.

Isso vem por inerência.

Celebra cada dia

Por aquilo que ele vale – é único!

Celebra-te a ti própria:

Nada nem ninguém te podem imitar:

És Única! És, no entanto, apenas tu!

W.J.